Entrevista com o sonidista Alejandro Seba
Alejandro Seba é um sonidista argentino, professor da Universidade de Buenos Aires (UBA), da Universidade Nacional de La Plata (UNLP), da Escola Nacional de Experimentação e Investigação Cinematográfica (ENERC) e do Centro de Investigação Cinematográfica (CIC). Trabalha também como editor de imagem desde 1992 e a partir de 1997 com o som em meios audiovisuais. É também idealizador do site Sonidoanda.org. Atualmente cursa o doutorado em Arte Contemporânea Latinoamericana, na UNLP, e investiga o desenho sonoro audiovisual vinculado à realização artística e técnica.
Artesãos do Som: Como surgiu o interesse de trabalhar com o som no cinema depois de ter iniciado o trabalho com a edição de imagem? Como foi essa transição de áreas? Se necessário, contar um pouco da sua formação como profissional de cinema.
Alejandro Seba: Minha aproximação com o audiovisual se deu por meio de diferentes lugares. Desde pequeno era amante da música. Aos 11 anos passava muito tempo ouvindo música no rádio e, nessa época, ganhei um gravador AcousTech. Assim, eu já preparava meus próprios materiais gravados. Aos 20 anos comecei a estudar primeiro desenho. Depois, parti para a fotografia e finalmente vídeo. Comprei minha primeira câmera S-Vhs Panasonic M-8000, com a qual comecei a gravar eventos (aniversários, casamentos, etc.). Aí, fui comprando os equipamentos necessários para editar na minha casa (um mixer AV5 e duas editoras Panasonic FS200, entre outros).
Em um determinado momento senti que minha formação autodidata necessitava de um enfoque acadêmico. Então, comecei a estudar na Universidade de Buenos Aires, no curso de Desenho de Imagem e Som. Queria ser montador (editor de imagem). Haviam comentários que no curso tinha um excelente professor de montagem, mas ele foi pra Cuba produzir seu filme e os substitutos que deixou eram verdadeiros desastres. Eu estava namorando uma garota que estava cursando uma disciplina chamada “Elaboração de Banda Sonora” do terceiro ano do curso, com um professor maravilhoso chamado Carmelo Saitta. Aí descobri o significado da banda sonora de um filme e decidi me dedicar a fazer isso.
Continuei gostando de edição de imagem, mas uns anos mais tarde tive a sorte de ser convidado por Eduardo Vaisman (que eu havia conhecido ao também cursar a disciplina “Elaboração de Banda Sonora”) para trabalhar como editor de som em um estúdio chamado Audiocomplex. Aí aprendi a manejar o ProTools em 1997, quando existiam muito poucos estúdios equipados com essa ferramenta.
AS: Como as habilidades de seu trabalho com edição de imagem complementam ou influenciam seu trabalho com o som e vice versa?
Seba: O som de um filme só pode ser bom se pensaram em um filme com um bom som. Ou seja, se ao escrevemos um roteiro não gerarmos espaço para o som, dificilmente ele poderá ser determinante para a história. Os filmes que mais nos impactam sonoramente não os fazem porque soam melhor, mas sim pelo fato do som ter um papel narrativo preciso. Nesse sentido, o desenho sonoro deve ser uma tarefa iniciada pelo roteirista, levada a diante pelo diretor e logo, apoiada e concretizada pelos editores de imagem e som.
O montador ou editor de imagem será quem deixará o espaço para que o som possa ser atuante, e não apenas um fator técnico. Os bons editores de imagem devem saber muito de ritmo, de música, da relação entre o espaço off e dentro do quadro. Em resumo, eles precisam saber de som.
Da mesma forma, um editor de som que não respeita o ritmo estabelecido pela montagem pode chegar a destruir a edição de uma cena. Quando a imagem chega ao estúdio de som, muitas questões já estão resolvidas. Contudo, o editor de som deve garantir que o trabalho do editor de imagem junto ao diretor se potencialize, ao invés de desestruturá-lo.
AS: Quais são as principais dificuldades de se trabalhar com o som no cinema Argentino?
Seba: Suponho que, como na maioria dos países latino-americanos, o orçamento é o pior inimigo. Nem todos os produtores são conscientes do quanto realmente deve ser gasto com o som e terminam designando certas tarefas com o dinheiro que resta. Em segundo lugar, o desconhecimento por parte de alguns diretores e produtores sobre o que realmente significa o som em um filme. Até pouco tempo atrás se pensava no som como uma questão técnica. Para alguns, um “mal necessário”. Porém, quando um diretor constata a importância do som na sua história (desde a técnica, mas sobretudo narrativo), fica mais fácil propor coisas pois o trabalho começa a ser realizado em conjunto.
AS: O número de novos cursos e escolas de cinema crescem a cada dia. Você como professor, tem notado uma evolução para com o estudo do som nas escolas de cinema e universidades na Argentina?
Seba: Na Argentina tem uma geração de professores jovens, muitos deles provenientes tanto do mercado quanto das universidades. A mentalidade é educar os realizadores sobre o que significa o som de um filme. Alguns com métodos mais vinculados ao campo teórico, outros mais próximos à prática de realização. Mas com o mesmo desejo de incentivar os alunos a pensar o som como uma potente ferramenta dentro do audiovisual. Isso inverte a situação existente a quase 20 anos, onde os docentes não revelavam seus “segredos” como se isso fosse assegurar seu posto de trabalho. Os docentes de hoje entendem que formando melhores profissionais, algo bom retornará quando chegar a hora de trabalhar junto com eles.
AS: Conte-nos sobre o Sonidoanda.org. O que é? Quando, como e por que surgiu? Apresente-o para os brasileiros.
Seba: Em 2002 me nomearam professor titular da disciplina “Sonido I“, dentro do curso de Desenho de Imagem e Som da UBA. Assim que comecei, decidi abrir um canal de comunicação com os alunos e que pudesse levar informações aos ex-alunos. Começou com um site gratuito utilizando freeservers, chamado “Sonido Uno”. Um ano mais tarde decidimos pagar pelo nosso próprio espaço. Ocorreu-nos colocar “Sonidoanda” porque na Argentina, quando está para se filmar uma tomada, o diretor diz: “Silencio, va toma…”. Ele então pergunta: “Sonido?” e o sonidista começa a gravar e responde: “Anda!“. Em seguida, o assistente marca a tomada com a claquete e o diretor grita: “Acción!”. Nos parecia uma palavra característica da filmagem, que dialoga com a comunicação com o diretor e a predisposição do sonidista.
Hoje em dia é a página do departamento da UBA e de outras universidades onde dou aula, mas também há materiais extras que achamos interessante compartilhar. Sempre tivemos a idéia de expandir para além da sala de aula, mas nem sempre temos o tempo para dedicar a atenção que precisa. Atualmente é possível assistir um vídeo que comemora os 10 anos da disciplina e fazer um passeio pelas diferentes páginas que tivemos.
*Entrevista original em espanhol: Versão em espanhol